terça-feira, 24 de maio de 2011

o frango


I
Caso fosse
tratar-se-ia de um frango.

Não um galo, nem abutre
e muito menos águia.

Um malmente e simples
frango
de pescoço desplumado
corpo mediano
e uma pata que não lhe funciona...

Andaria torto de tão desnorteado
de tão mentiroso
de tão pouca coisa que seria nesse mundo vasto.

Caso fosse
deveríamos falar,
a bem da verdade,
que um dia aparentou ser galo
o quase foi
ou, vai, foi.
Teria sido.

Um galo sorridente
de plumagem brilhoso
e estepes importadas.

Um galo que teria por filha e esposa
mamíferas de grande porte
que viajarousse com suas asas de galo
o mundo das aves maiores
dos felinos
das taurinas.

Galo pleno, fosse
que poderia ter sido galinha,
que não se trata de gênero,
mas de tamanho de bico.

Mas era frango e sempre foi
covarde
estúpido
rancoroso
e sujo
frango de penas descoloridas
de penas antigas
para quem o amor depois do amor
é a morte
a traição
a chantagem
a dor.

(e tiremos de uma vez
o bafinho pateta da crítica:
aqui não se tratou de destinos
como na poesia maldita,
mas de decisões
como no dia-a-dia da prostitutas)

Sem galo para ser,
depois da onça ter descoberto
que aquele minúsculo coração
não satisfaria sua fome,
depois de levar consigo o touro
para pastos melhores
para céus violáceos,
ele
descobrindo sua inescapável franguidade
decidiu achar a espora do pai
(de algum pai)
afiar
envenenar
e cravar no coração do mundo
-onça e touro incluídas-
que dormia em paz.

Afortunadamente onça é onça e frango é frango.
A brutal natureza da perspectiva.
De meio olho aberto ela resistiu o ataque
E envolveu o touro com o rabo de fogo
Enquanto segurava sua pata para não fazer mais dano.

Claro, caso fosse
caso houvesse
caso tivesse
mas não foi.

Não é.
Ele é apenas inexistência.



II.
Pero me atacó de nuevo
una mañana de invierno
veneno traía en su espuela
y yo ya estaba de mal humor.

Al pollo miserable le
                        corté una pata
la pata buena
con estos mis dientes finos.

Le quité 100 plumas
            11 días después
                        y un pedazo de pico.

Maldito seas rata-pollo
Para siempre seas
Inmundo y pollo
de media pierna pollo
medio pico
y huecos de piel sangrante

Una mañana nublada
la más caliente del invierno
me despertó con la
            espuela
en la garganta
el pico en el ojo
ojitos de ira
tan cagada de miedo
que daba risa.

Lo golpeé un poco
agarrado del pescuezo
solemnemente
contra la pared,
mientras me quitaba el sueño.

Ay, cómo se lamentaba el maldito
cómo sufría
se quejaba de la injusticia de su vida
culpaba a todas sus madres e hijas
qué angustia
qué dolor qué dolor qué pena.

Entonces fue cuando vi el desastre.

Alrededor del pollo,
la ciudad,
ésta que ama mártires y víctimas
sus hijas
llorando, odiándome
odiándose
en un éxtasis de compasión
y yo
que no creo en miserias
absolutamente derrotado
fuego asesino
bestia primaria
rabia.

III.
Entonces respiro.
Ele é.
Uma apenas existência
que nos levou à guerra.
Mas crocodilo é crocodilo. E frango é frango
La brutal naturaleza de la relación.

Como o exuzinho da lavanderia
que achou por bem,
às seis horas da manhã,
arrebentar a mangueira do tanque.